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terça-feira, 4 de maio de 2010

Caos

Márcio dirigia para o trabalho. Na rua, a fumaça dos carros davam um tom acinzentado, quase londrino, à cidade.
Ele pensava no jantar da noite anterior. Nas mãos macias de Helena.

25 minutos parado no trânsito. Começava a se inquietar, trocava o cd e elaborava suas primeiras frases ao entrar no escritório: Senhor Alexandre, desculpe o atraso, foi o congestionamento. Quando tomarão medidas suficientes para organizar o trânsito da cidade? Logo chegaremos ao caos.

37 minutos parado no trânsito. Buzinas. O sentimento de impaciência. Começava a perceber detalhes: o pedinte maltratado, o prédio de fachada descascada. Que miséria. Ainda bem que tinha um emprego estável e, logo, formaria sua família com Helena.

50 minutos parado no trânsito. A impaciência, já corpórea, senta ao seu lado e o alfineta: se contabilizássemos todo tempo perdido em situações como esta, certamente não te restaria nem ¼ de sua vida para atividades realmente importantes. A cidade agora começa a ganhar ares tenebrosos. O pedinte lança um olhar de ódio e ameaça quebrar o vidro do carro e esfaquear certeiramente sua jugular. O prédio de fachada descascada começa a rachar. Logo os carros seriam entulhados pela parede velha e os pedestres soterrados. Bombeiros chegariam para socorrê-los, mas, para a senhora franzina que aguardava o ônibus seria tarde demais.

1 hora e 20 minutos parado no trânsito! Cidade infernal. Mudar-se-ia com urgência. E também terminaria com Helena. Como poderia casar com alguém tão dissimulada. Sua amiga Rita já havia avisado que toda aquela delicadeza não passava de puro fingimento. As mulheres são assim, transformam-se após o casamento. Tornam-se irreconhecíveis. Mas também pediria demissão. Sim, demissão. Não o valorizavam. Três anos e nenhuma promoção. O salário era baixo, os colegas incompetentes.

1 hora e 45 minutos parado no trânsito. Pensava agora na morte. Uma morte lenta e dolorosa.

Um apito e os carros começaram a ganhar velocidade. O ar circulava. O céu estava azul. Ligaria para Helena para almoçarem juntos.